MotoGP 2022 – Nos anos 70 já havia motos com asas!

MotoGP é usado pelos fabricantes para mostrarem os seus conhecimentos em aerodinâmica. Mas nos anos 70 já havia motos com asas!

asas

Quando a categoria rainha do motociclismo mundial, MotoGP, é o palco ou cenário onde os grandes fabricantes apresentam ao mundo as mais avançadas tecnologias aplicadas às duas rodas. Os protótipos de MotoGP atuais são verdadeiras “armas de eficácia”, motos extremamente rápidas em qualquer situação. E um dos maiores avanços conseguidos recentemente serão os pacotes aerodinâmicos com asas que vemos em todas as motos de MotoGP, sem exceção!

Mas será que as asas aerodinâmicas apenas apareceram nas MotoGP?

Na realidade, os conceitos de aerodinâmica sempre estiveram presentes nas corridas de moto. Aliás, em qualquer tipo de veículo de competição desenhado para ir mais rápido do que os rivais, os fabricantes procuram sempre uma aerodinâmica apurada e afinada ao detalhe.

Mas atualmente as motos de MotoGP usam (e por vezes abusam!) das asas aerodinâmicas, componentes que vieram para ficar, pese embora a controvérsia inicial provocada em pilotos e nos fãs.

E mesmo que muitos fãs das corridas de motos não se recordem, a realidade é que as asas não são algo recente.

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asasTalvez poucos se recordem, mas a MV Agusta apresentou, e testou, um protótipo de uma moto de competição equipada com motor de quatro cilindros e 500 cc. Mas o seu motor, que só por si era uma maravilha da engenharia e inclusivamente apresentava tecnologias atuais como a cambota contrarrotante que vemos nas MotoGP modernas, não era o detalhe mais importante nesta italiana.

Na realidade, o protótipo desta MV Agusta de 1972 foi testado por Phil Read no circuito de Assen no sentido da marca italiana e os seus engenheiros entenderem os efeitos da utilização de um par de asas dianteiras fixas à carenagem dianteira. Mais uma vez, uma ideia bastante semelhante ao que vemos nas atuais motos da categoria rainha.

asasMas talvez a ideia mais “fora da bolha” tenha sido vista nas corridas da Nova Zelândia.

Tudo porque em meados dos anos 70 do século passado o Dr. Rodger Freeth, um neozelandês que era piloto, mas, ao contrário de muitos dos pilotos locais da altura tirou um doutoramento em astrofísica e daí ter ficado conhecido como “Flying Doctor”, conseguiu aplicar os seus conhecimentos e ideias visionárias de aerodinâmica às motos.

Rodger Freeth conseguiu adquirir uma Yamaha TZ750 em 1977 e rapidamente estudou formas de melhorar a eficácia aerodinâmica da moto japonesa. Cerca de meio ano depois de ficar com a moto, Freeth mostrou ao mundo um pacote aerodinâmico revolucionário: uma grande asa dianteira e uma ainda maior, e elevada, asa traseira!

O objetivo de Rodger Freeth era claro: melhorar a performance da moto através da criação de força descendente.

asasDepois dos necessários testes, a TZ750 com asas estreou-se em competição em Manfield, em setembro de 1977. Surpreendidos pelo aparato das asas, pilotos e equipas rivais protestaram contra a utilização das asas aerodinâmicas de Rodger Freeth. O diretor da equipa decidiu então ordenar a remoção da asa traseira… mas manteve a asa dianteira.

Um mês depois, numa corrida em estradas públicas, e ainda sem decisão final sobre a legalidade ou ilegalidade das asas por parte da NZACU, os comissários permitiram a Rodger Freeth usar as asas dianteira e traseira na Yamaha TZ750, embora a equipa tenha optado por manter a configuração apenas com asa dianteira. Mas ainda assim a sua eficácia ficou comprovada, com três segundos lugares em corridas realizadas à chuva.

Em novembro desse ano, numa reunião pré-corrida, a NZACU decidiu que as asas eram demasiado perigosas e por isso seriam banidas, impedindo então a versão aerodinâmica Yamaha TZ750 de competir. Para os organizadores do campeonato neozelandês, era claro que as asas seriam perigosas em caso de contacto com pilotos, particularmente nas discussões por posição em pista.

asasApesar de ver o seu design aerodinâmico banido da competição, o Dr. Rodger Freeth viu o seu conceito demonstrar o seu valor. Inclusivamente numa sessão de testes no circuito neozelandês Pukekohe, a Yamaha TZ750 com asas aerodinâmicas conseguiu rodar cerca de 2 a 2,5 segundos mais rápido do que sem as asas instaladas!

Mas este neozelandês doutorado em astrofísica não foi o único a testar os conceitos de aerodinâmica gerados pela aplicação de asas em motos. E o terceiro projeto aerodinâmico vem da cabeça de um piloto da Rodésia que passou a especializar-se no fabrico de quadros.

Colin Lyster não será um nome propriamente conhecido entre nós, a não ser para aqueles fanáticos das café racer. Lyster decidiu dar um novo rumo à sua vida e abandonou a carreira de piloto na Rodésia, viajando para Inglaterra no início dos anos 60 do século passado.

Rapidamente aplicou as suas ideias e talento na modificação de quadros de motos Triumph e Honda. Fazia quadro mais leves e alterava também a sua rigidez, usando o motor como elemento estrutural.

Mas o seu primeiro grande contributo para as motos de competição não foi esse, nem as asas aerodinâmicas.

Lyster inventou o primeiro sistema de três discos de travão para motos de competição. O sistema começou a ser usado por equipas em meados dos anos 60, e em 1971 passou a estar disponível ao público. Naquela altura o interesse neste sistema de triplo disco de travão não “pegou”, e Colin Lyster vendeu a patente à AP Lockheed e a Honda depois usou discos de travão em 1968 numa moto de produção.

Mas se este homem nascido na Rodésia e depois a viver em Inglaterra ficou famoso pelo seu sistema de travagem de três discos, porque estamos a falar dele num artigo de asas aerodinâmicas em motos?

Falamos em Colin Lyster pois ele desenvolveu um conceito de asa traseira com ângulo de ataque (posição da asa) ajustável de acordo com as necessidades do piloto e do momento. Um sistema de asa traseira dinâmica.

A asa traseira de Lyster foi criada para funcionar como um travão aerodinâmico, usando por base uma Honda 450 de competição. Quando o piloto chegava a uma curva, a asa alterava de posição, funcionando de travão aerodinâmico, ajudando a reduzir a velocidade de forma ainda mais rápida do que usando apenas os convencionais travões. Contudo, a ideia não avançou muito, pois com o alterar da posição da asa fixa em posição elevada para criar mais arrasto, verificou-se que se reduzia demasiado a carga no eixo vertical da roda dianteira.

Não é difícil imaginar que isso desestabilizava, de forma quase incontrolável e repentina, a moto no momento de travagem.

Por outro lado, o conceito aerodinâmico criado por Colin Lyster gerava uma maior inércia nos momentos de troca de direção, devido ao peso adicional pela utilização da estrutura de suporte da asa na traseira, para além de colocar demasiado peso no eixo traseiro e reposicionar o centro de gravidade da moto mais para trás e para cima, causando dificuldade no controlo da moto.

Como vê por estes três exemplos que referimos neste artigo, o conceito de asas aerodinâmicas em motos, e mais precisamente na competição, não é algo exclusivo das MotoGP modernas. Já há muito que inovadores ligados ao mundo das duas rodas testam os limites da aerodinâmica com propostas radicais e disruptoras.