Todos aqueles que têm uma moto, seja ela uma scooter de baixa cilindrada ou uma superdesportiva para bater os tempos por volta em circuito, sabem que o sistema de travagem da moto é fundamental para a sua condução e segurança. Dentro dos diversos componentes de um sistema de travagem de uma moto, encontramos as pastilhas de travão.
As pastilhas de travão são dos um dos elementos de uma moto que são submetidos a maior esforço, e que mais vezes são solicitados enquanto conduzimos a moto.
Por isso, e para além de ter em atenção o momento certo para trocar de pastilhas de travão devido ao seu desgaste, deverá também seguir um conjunto de dicas que preparámos em conjunto com auxílio da Brembo, marca italiana especialista em travões e respetivos componentes, e que o ajudarão a escolher as pastilhas de travão mais corretas para a sua moto e para a forma como a utiliza.
Este conjunto de dicas será bastante útil para entender as diferentes opções que são comercializadas pelos principais fabricantes, e mesmo que este artigo se refira especificamente a componentes da Brembo, a verdade é que estas informações podem ser adaptadas a pastilhas de travão de outras marcas.
O objetivo é disponibilizar-lhe um guia o mais completo possível, como forma de lhe permitir escolher as pastilhas de travão da sua moto que sejam as mais acertadas para si.
E mesmo que num primeiro momento lhe possa parecer que a escolha da pastilha certa é uma decisão fácil, a verdade é que, tal como acontece com discos ou pinças de travão, não existe uma solução universal. Ou seja, não existe uma pastilha de travão que seja melhor do que todas as outras para ser usada em todos os tipos de motos e em todas as condições.
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Começamos então estas dicas por entender a base das pastilhas de travão. Podemos classificar as pastilhas em duas famílias distintas: orgânicas ou sinterizadas.
Pese embora a composição química do material de fricção, como é natural, seja diferente entre os diversos fabricantes, de uma forma geral podemos definir as pastilhas como integrando estas duas famílias.
As pastilhas sinterizadas são compostas por pós metálicos que são unidos entre si através de um processo denominado de sinterização, que não recorre a aglomerantes. O coeficiente de fricção depende do tipo de pós metálicos utilizados na mistura destas pastilhas. Os lubrificantes que se juntam ao composto inicial garantem uma travagem constante, sendo que os abrasivos servem para manter os discos limpos, pois ajudam a eliminar os depósitos de pó de travão que se acumulam nos discos.
Dentro das pastilhas orgânicas podemos englobar todas aquelas que não são fabricadas por processo de sinterização. Por isso também podemos incluir neste tipo de pastilhas de travão as do tipo carbocerâmico ou carbon-tech. O elemento principal nestas pastilhas é a resina (ou resinas) aglutinadora. As pastilhas orgânicas também contêm lubrificantes e abrasivos para garantir que têm as mesmas vantagens das sinterizadas, conforme já referimos.
O principal motivo pelo qual deve pensar de forma ponderada sobre qual a pastilha que vai montar na sua moto, é porque cada tipo foi concebido e testado para oferecer o melhor em determinadas situações. Não apenas em termos de prestações, como também de desgaste, conforto ou estabilidade.
Cada tipo de mistura tem o seu ‘raio de ação’ específico. E esse raio de ação depende das diferentes situações que uma pastilha de travão tem de enfrentar. As prestações das misturas das pastilhas de travão são muito diferentes entre si, e podemos medir isso pelos seguintes parâmetros: a eficiência e o desgaste.
A eficiência (o mesmo que dizer quanto é que uma pastilha consegue travar) é expressa pelo coeficiente médio de fricção e a estabilidade da fricção perante as principais magnitudes que caracterizam a travagem (velocidade, desaceleração, temperatura). A eficiência é medida realizando-se testes específicos num banco de ensaios e com auxílio de uma moto.
Já o desgaste é expresso na quantidade de material de fricção que é consumido (na espessura / milímetros ou em volume) em relação ao número de travagens realizadas (no banco de ensaio) ou quilómetros percorridos (na moto).
A eficiência e o desgaste, por norma, estão relacionados: quanto mais eficiente é uma mistura, mais rapidamente se desgasta.
Outro aspeto a ter em conta são as variações do coeficiente de fricção em função da temperatura de funcionamento. De facto, nem todas as misturas têm a mesma eficácia a todas as temperaturas. Por exemplo, as pastilhas de travão para circuito têm um coeficiente de fricção em quente muito elevado, mas, até que alcancem temperatura (entre 350 a 450°C), não podemos falar em condições normais de funcionamento.
Nos compostos de estrada acontece precisamente o contrário, pois estão concebidos para garantir as melhores prestações a temperaturas médias / baixas, a cerca de 300°C.
Se utilizarmos estas pastilhas de travão em circuito e as submetemos a esforços sucessivos, a travagem será afetada pelo que habitualmente conhecemos como “fading”, ou seja, uma degradação acentuada do coeficiente de fricção. A partir de uma determinada temperatura têm uma tendência a perder a sua eficiência.
Em sentido contrário, se utilizarmos compostos Racing em estrada (o que significa que os discos estão mais frios), a fricção não será tão boa e até poderá acontecer que a distância de travagem aumente.
Os compostos intermédios são, obviamente, um ponto de equilíbrio entre as duas situações que acabámos de referir: oferecem boas prestações em qualquer condição de uso, mas nunca serão as melhores pastilhas de travão em qualquer um dos extremos de temperatura.
Então qual é a pastilha que deve escolher para a sua moto e o uso que lhe vai dar?
Aproveitando a ajuda da Brembo, e, recordamos, outros fabricantes de pastilhas de travão podem definir as diversas opções com outros nomes ou cores, mas os conceitos base são os mesmos, verificamos que a marca italiana divide as suas opções em cinco macro categorias.
Racing para uso em pista, Road para uso em estrada, Off-Road para uso fora de estrada, Scooter para uso em scooters, como o nome indica, ou, por último, as pastilhas da categoria Genunine que são basicamente iguais às usadas pelo fabricante da moto quanto esta sai da linha de montagem na fábrica.
Cada uma destas categorias disponibilizará entre duas ou quatro alternativas, de acordo com os processos de fabrico e material de fricção usado. Mas as principais diferenças são as pastilhas sinterizadas ou orgânicas.
As pastilhas de travão por categoria
Scooter
As pastilhas Brembo para scooters (de duas ou três rodas) foram concebidas para oferecer maior durabilidade e estabilidade em qualquer situação de utilização. Foram concebidas especificamente para este tipo de veículos, para travagens características de uma utilização urbana.
Para as scooters, encontramos dois compostos diferentes: XS e CC.
Uma pastilha XS é sinterizada e foi pensada para ser usada especificamente nas maxiscooters, ou em scooters de prestações mais elevadas. As vantagens deste tipo de pastilha são a maior modulação da potência de travagem, mais potência, e boa resistência ao desgaste pese embora o coeficiente de fricção seja mais suave do que aquele que se utiliza nas motos. O coeficiente de fricção é de 0,48 a 50°C e chega a ser de 0,50 a 200°C.
Outra vantagem das pastilhas XS é o período de “rodagem” mais reduzido.
As pastilhas CC da gama Scooter são do tipo orgânico. Estão pensadas para ser aplicadas no sistema de travagem de qualquer tipo de scooter, incluindo ciclomotores de 50 cc. Serão as pastilhas de travão ideais para aqueles que não precisam de uma potência de travagem demasiado elevada, mas procuram boas prestações e, sobretudo, uma maior resistência ao desgaste.
Este tipo de pastilha dura mais e o seu preço é mais baixo. Ao contrário da XS, a pastilha CC utiliza o mesmo material orgânico que as restantes pastilhas Brembo para motos.
Qual o perigo de usar a pastilha Scooter errada?
Se montarmos uma pastilha XS, pensada para scooters mais pesadas e rápidas, a sua resposta ao apertar o travão será mais imediata e brusca, perdendo todas as características de modulação da potência disponível. O consumo também aumenta de forma desproporcionada e ao fim de pouco tempo seria necessário trocar de pastilhas novamente.
Pelo contrário, se usarmos uma pastilha do tipo CC numa scooter de grande cilindrada, isso iria aumentar a distância de travagem, pois estas pastilhas de travão não foram desenvolvidas para toda a potência de travagem disponível nas scooters de média ou maiores dimensões.
Road
Na gama de pastilhas de travão para motos de estrada a Brembo disponibiliza quatro opções: três são do tipo sinterizado e uma orgânica, a CC. Esta última está adaptada a motos mais “tranquilas”, habitualmente com cilindrada inferior aos 400 cc.
Ao não ter de controlar uma potência muito elevada ou binário, estas motos não necessitam de uma potência de travagem elevada. De facto, o seu coeficiente de fricção é o mais baixo das quatro opções. De outro ponto de vista, as pastilhas CC são as melhores para os motociclistas que pretendem uma travagem modulada / progressiva e mais suave.
Dentro das opções sinterizadas, a única que é específica para o eixo traseiro é a SP. Um dos seus pontos fortes é que garante, de acordo com a Brembo, prestações constantes, tanto em frio como em quente. E isso é visível através do seu coeficiente de fricção que se mantém constante num intervalo de temperaturas entre os 50 até aos 400°C.
Para o travão dianteiro é possível escolher entre duas opções: SA ou LA.
A primeira, a SA, é a pastilha com as melhores prestações de todas as disponíveis na gama Road. É ideal para aqueles motociclistas que são apaixonados por prestações, e capaz de corresponder às exigências de uma pontual visita ao circuito. O valor do seu coeficiente de fricção aumenta conforme a temperatura aumenta. Supera todos os restantes compostos quando a temperatura da pastilha se encontra entre os 300 e os 400°C.
Se, por outro lado, é daqueles motociclistas que gostam de prestações elevadas, mas dão um uso menos exigente à moto e mais turístico, devorando quilómetros todos os anos, a escolha acertada será a pastilha LA. Destaca-se pelas boas prestações e estabilidade, aos quais se soma uma resistência maior. O que significa que, em igualdade de quilómetros, as pastilhas LA ainda estarão boas num momento em que as SA estarão a atingir o seu limite.
E isso pode ser confirmado no coeficiente de fricção. No caso das LA, o coeficiente mantém-se constantemente nos 0,55 praticamente entre os 50 e os 400°C.
Qual o perigo de usar a pastilha Road errada?
O que acontece se usarmos uma pastilha SA numa moto de baixa cilindrada, que se utilizará maioritariamente em cidade? Ao estar estudada para garantir as prestações máximas, iria apresentar dois problemas: demora a alcançar a temperatura de funcionamento correta, gerando uma travagem débil ou uma travagem demasiado brusca.
Em ambos os casos o desgaste da pastilha seria anormal.
Se usar uma pastilha CC numa superdesportiva, será mais complicado conseguir travar, sobretudo quando conduzir a velocidades mais elevadas.
De facto, estas pastilhas de travão não são adequadas para suportar toda a potência de travagem que é necessária para estas motos. Assim, o resultado seria conduzir uma moto com metade das prestações, embora tenha sido uma moto bem cara: brilhante em aceleração e deficiente em travagem.
Off-Road
Aqueles que utilizam as motos em pisos de terra sem asfalto não necessitam de uma grande potência de travagem. Isto porque não poderão descarregar por completo a potência total de travagem pois não dispõem de uma superfície estável. Para este tipo de utilização a Brembo disponibiliza três compostos diferentes para usufruir de uma boa resposta sem recorrer em demasia aos travões, e podem ser montadas tanto no eixo dianteiro como traseiro.
Estas pastilhas de travão utilizam compostos específicos para serem usadas em condições muito diferentes de utilização. Em frio, em quente, ou até em situações especiais como com água, areia ou lama. E também têm de funcionar com os discos de travão frios. Por essa razão estas pastilhas usam materiais resistentes aos agentes externos.
Para os motociclistas que praticam motocross, o ideal será o composto SX, uma pastilha do tipo sinterizado, desenhada para competição. Os pontos fortes desta pastilha são a sua “mordida agressiva” e resistência às temperaturas mais elevadas. Aqueles que praticam enduro, poderão optar pelo composto SD, uma pastilha sinterizada que se destacará pela maior progressividade.
A estas duas pastilhas sinterizadas junta-se uma terceira opção orgânica, recomendada para motociclistas que precisam de percorrer muitos quilómetros fora de estrada usufruindo das melhores prestações de travagem.
A pastilha TT é fabricada em material carbocerâmico semimetálico, adaptando-se tanto a condições de uso em seco ou em molhado. Em termos de coeficiente de fricção está sempre abaixo do composto SD, mas a diferença nunca é elevada.
Qual o perigo de utilizar a pastilha Off-Road errada?
O que é que aconteceria se utilizasse uma pastilha do tipo SX numa moto trail carregada com malas e passageiro? Ao estar concebida para uma utilização em motos mais “enérgicas”, teria dificuldades em conseguir travar uma moto destas dimensões.
Numa condução turística, quando os travões não são usados durante longos períodos, a temperatura desce e a eficácia dos travões reduz bastante.
Pelo contrário, se montar uma pastilha do tipo TT numa moto reduzida à sua expressão mínima, como as que são usadas nos campeonatos de motocross, a sua resposta seria deficitária: em cada travagem os pilotos rivais iriam ganhar muitos metros porque à TT falta a potência de travagem da SX.
Certamente que não seria necessário trocar de pastilhas tão frequentemente, mas num campeonato o que interessa é ganhar, e não em poupar.
Racing
As principais características destes materiais são o seu elevado coeficiente de fricção e rendimento constante, especialmente quanto o disco de travão atinge temperaturas muito elevadas. Estas características permitem usufruir de uma travagem excelente e uniforme durante toda a sessão em pista, reduzindo ao mínimo, ou a circunstâncias excecionais, o efeito de “fading”.
Neste caso das pastilhas Racing, a eficácia a temperaturas baixas é o menos importante. Por isso, estas pastilhas de travão não são apropriadas para uso em motos que são conduzidas em estrada.
Em comparação com as pastilhas SA e LA que integram a gama Road, as variantes para uso em pista garantem elevados níveis de coeficiente de fricção, que aumentam em função da temperatura de funcionamento. Por isso, situam-se imediatamente abaixo das Z04 que são utilizadas por muitos pilotos do Mundial Superbike.
A pastilha orgânica RC de carbon-tech é aquela que oferece as melhores prestações de todas. O seu coeficiente de fricção a temperatura elevada é de nível superior, proporcionando uma travagem potente e estável, sem que se note o temido efeito de “fading”, que se traduz num curso maior da manete ou pedal de travão. Este composto está disponível para todas as superdesportivas e para as naked mais desportivas.
Parecido com a RC, mas num nível ligeiramente inferior, existe o composto SC.
Também está desenhado para ser utilizado apenas no travão dianteiro, pois no traseiro não é preciso tanta potência. As pastilhas de travão SC mantêm a estabilidade de travagem em qualquer situação, mas não são recomendáveis para uma utilização extrema em pista, estando bem-adaptadas para uma utilização “agressiva” em estrada. Convém ter em conta que as pastilhas SC sofrem oscilações no coeficiente de fricção de acordo com a temperatura.
As pastilhas Racing Z04 merecem um comentário separado.
Estas pastilhas de travão são utilizadas pelos pilotos do Mundial Superbike e Supersport. Esta é a gama de pastilhas da Brembo de prestações elevadas e que foram concebidas pela marca italiana exclusivamente para competição e para garantirem as máximas prestações nas condições mais extremas. Maior controlo da travagem, maior estabilidade na travagem, maior potência de travagem, maior resistência à temperatura elevada e um menor desgaste.
As pastilhas Racing Z04 são o mais próximo que o motociclista comum poderá comprar de uma pastilha de travão “factory racing”, estando já disponíveis em variantes que são adaptadas à grande maioria das superdesportivas atuais.
Nestas pastilhas de travão o funcionamento a baixas temperaturas não é o foco. Por isso, não são as mais indicadas para uso em estrada. A Brembo, inclusivamente, recomenda que os motociclistas que utilizem estas pastilhas nas motos de “track day” (pista), as troquem por outras assim que as suas motos regressam à configuração de estrada.
As principais características das Z04 são o seu coeficiente de fricção e rendimento constante, em particular quando o disco de travão está numa temperatura muito elevada. Devido a estas características, garantem uma travagem mais forte e constante durante toda a duração das sessões em pista. E são também mais resistentes ao efeito de “fading”.
Qual o perigo de utilizar a pastilha Racing errada?
Se montarmos uma pastilha SC numa superdesportiva, desde as primeiras travagens vamos usufruir de uma travagem superior, pois o coeficiente de fricção é maior a temperaturas mais baixas.
Mas conforme as voltas vão acumulando, o sistema vai apresentar um pouco de sobreaquecimento, a distância de travagem aumenta cada vez mais, até que, nos casos mais extremos, o sistema de travagem irá falhar por completo.
No caso de montarmos uma pastilha RC numa moto de estrada, mais leve ou que tenha potência reduzida, ficaremos igualmente dececionados.
A resposta do sistema de travagem será demasiado brusca ao mínimo toque no travão, correndo maiores riscos de sofrer uma queda devido ao efeito “on / off”, ou pouca progressividade, retirando todo o prazer de conduzir uma moto. Para além da perda de progressividade, estas pastilhas apresentam um desgaste mais rápido, o que iria obrigar a trocar de pastilhas mais frequentemente e levar a custos mais elevados.
É preciso fazer rodagem às pastilhas de travão?
Por último, e como nota final para todos aqueles que instalem pastilhas de travão novas nas suas motos, convém ter em atenção que é preciso efetuar a rodagem das pastilhas. Em particular no caso do composto RC.
Para fazer a rodagem correta será preciso realizar uma série de travagens ligeiras ou mais curtas, deixando passar algum tempo entre cada acionamento dos travões.
Desta forma serão realizados os ciclos de aquecimento / arrefecimento do sistema. E tenha em conta que o período de rodagem das pastilhas de travão depende do tipo de pastilha: as orgânicas necessitam de uma rodagem maior do que as sinterizadas.
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