Texto: Vitor Martins. Fotos: Motojornal.
A história da Tech 3 como equipa remonta ao início dos anos 90 do século passado quando Hervé Poncharal, até então piloto, resolveu em parceria com Guy Coulon e Bernard Martignac criar uma equipa. Inicialmente para competir em 250cc com motores oriundos de outras marcas nipónicas, até se juntar em 1999 aos homens da Yamaha, para tornarem a Tech3 a formação oficial do construtor no mundial 250, campeonato que venceram no ano seguinte com Olivier Jacque. Uma prestação que transformou a equipa em estrutura satélite no ano seguinte, posição que manteve na Yamaha até ao final de 2018 quando trocou as suas cores pelas cores e aspirações dos ambiciosos austríacos da KTM, que no seu terceiro ano no campeonato, duplicaram a sua presença e abriram a porta a Miguel Oliveira para que este subisse ao campeonato maior. Um ano recheado de desafios que passam igualmente pelas Moto2 e pela nova MotoE onde a equipa do sul de França estará igualmente em pista. ‘Era natural que a KTM quisesse trazer o Miguel até ao MotoGP. De alguma forma ele tem sido a ‘arma’ nos últimos anos ao ser vice-campeão em Moto3 e Moto2 e podemos considerar – entre aspas claro – que ele é o primeiro piloto produzido pela KTM a chegar ao escalão maior com a KTM, aquilo que realmente a KTM pretende. Da minha parte sinto-me muito orgulhoso por poder ter um piloto como ele, super focado, rápido e com objectivos bem estruturados na sua carreira.’
Este é também um ano de muitas novidades, a todos os níveis, no seio da equipa.
‘Sem dúvida. Este ano tudo é novo para nós excepção feita a um dos pilotos. Como sabes estamos com uma nova marca, a KTM, o que para mim é uma novidade em quarenta anos de competição (como piloto e patrão de equipa) pois trabalhei com todas as marcas japonesas e nos últimos 20 anos estive sempre com a Yamaha, com a qual consegui grandes sucessos e uma relação fantástica. Mas por vezes temos que mudar, temos que procurar novos desafios, e foi com a KTM que os encontrei e resolvi aceitar a mudança.’
Um desafio bem grande…
‘Muito grande mesmo. A KTM é uma marca ainda muito nova no MotoGP – está apenas no terceiro ano – e nesta categoria as coisas não se fazem de um dia para o outro. Nós na equipa estamos a descobrir a moto e a forma de trabalhar dos austríacos e a cada fim‑de‑semana vamos percebendo quem é quem na estrutura e quem é que nos ajuda a resolver este ou aquele problema. São processos de adaptação e conhecimento que têm que ser feitos por todas as equipas que se juntam a uma nova marca e sinto que estamos cada vez mais entrosados a todos os níveis e com um objectivo bem claro, evoluir e começar a subir nas classificações, mas isso não se faz de um dia para o outro.’
Ao mesmo tempo tens um novo piloto na equipa, um ‘rookie’.
‘Tenho e muito bem. Estou muito contente com tudo aquilo que o Miguel fez até ao momento. Depois de no decorrer dos testes de Inverno o Miguel ter sido um ajuda muito importante no desenvolvimento da moto, com informações precisas e preciosas fornecidas aos nossos técnicos e aos elementos da fábrica, os resultados dele mostram a sua qualidade. Foi por muito pouco que não pontuámos no Qatar, na Argentina ele podia mesmo ter sido nono pois estava em luta com os irmãos Espargaró e podia ter fechado a corrida na frente deles. Mas foram cinco preciosos pontos logo na segunda corrida e de seguida mais dois no Texas. Pena foi a corrida de Jerez, que sabíamos ser complicada e tudo se confirmou sem conseguirmos pontuar, o que é sempre motivo de desilusão. No mínimo pontuar é a recompensa para todo o trabalho de fim‑de‑semana, é o prémio para todos os que trabalharam para que tal acontecesse e ficamos chateados quando isso não acontece.’
‘O Miguel foi uma ajuda importante no desenvolvimento da moto nos testes de inverno, com informações precisas e preciosas’
Querer pontuar não é ‘pouco’ para uma equipa com os vossos pergaminhos e resultados anteriores?
‘Não, de maneira nenhuma. Temos um piloto ‘rookie’ que chegou com o vice‑campeonato Moto2 mas sem experiência em MotoGP. Temos a moto mais recente do pelotão e por isso é o que podemos aspirar de forma honesta. Neste momento é isso, o que não quer dizer que aqui e ali não surja a oportunidade para estar nos dez primeiros – como na Argentina – e nesse momento tenho a certeza que o Miguel vai aproveitar. Mas não vale a pena sonhar com o que neste momento ainda não é real, temos que continuar a trabalhar e a criar as condições para sermos competitivos sempre, não apenas aqui e ali, e é isso que estamos a fazer com a KTM. Vamos lá chegar, mas não é amanhã.’
Em Jerez receberam igualmente novo material – tornando as vossas motos semelhantes às de fábrica – e realizaram um dia de testes.
‘Foi muito importante esse dia logo após o GP. Testámos os novos componentes que a KTM trouxe para o circuito e notámos evoluções positivas com melhoria dos tempos por volta. Algumas evoluções funcionam melhor que outras e as que melhor encaixam nas nossas motos serão adoptadas claro. Mas foi muito bom esse dia extra em Jerez de La Frontera.’
A Tech3 tem também uma equipa técnica muito jovem – liderada pelo mestre que é Guy Coulon – também ela a aprender…
‘É o reflexo das novas tecnologias, temos que ter gente mais jovem nas equipas, e isso é bom. Mas o Guy adapta-se muito bem a isso e tem um excelente relacionamento com todos eles ajudando igualmente os pilotos a evoluir no bom sentido. A mim cabe a tarefa de lhes encontrar as melhores condições para desenvolverem o seu trabalho e fazer com que a harmonia exista para que tudo siga a direcção que queremos. Somos como uma família e é isso que procuro que a todos sejam ao longo da época. Todos eles estão a aprender e estão no bom caminho desse processo.’
Em Le Mans o Miguel fez a sua estreia em piso molhado…uma surpresa?
‘Sim e não. Conhecendo já o Miguel como conheço a abordagem que ele fez foi exactamente aquela que esperava, mas foi uma surpresa ver que rapidamente ele estava à vontade com aquela moto no asfalto molhado. Fez voltas excelentes e de forma consistente e isso naturalmente que me deixou orgulhoso acima de tudo. Sei que tenho um piloto que vai certamente destacar-se neste campeonato, mas temos que o deixar crescer, trabalhar, descobrir…temos também que o ajudar e isso é muito importante.’ Palavras de Hervé Poncharal em Le Mans, naquele que é o GP da Tech3 e onde pela primeira vez em 2019 os seus dois pilotos pontuaram após 27 sofridas voltas que acompanhámos junto ao francês no muro de boxes da equipa. Uma experiência e uma ‘escola’ também no entender dos dados revelados nos diversos ecrãs de cronometragem que o Poncharal analisa com rapidez para perceber se vem lá uma boa volta… previsão que raramente falha. De Le Mans a caravana seguiu para Mugello, o traçado onde Miguel Oliveira se estreou a vencer e onde ganhou nas restantes duas categorias do campeonato.
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