Quando no primeiro dia do Grande Prémio da Áustria surgiram os primeiros rumores da introdução de corridas Sprint em MotoGP, o paddock do Mundial de Velocidade, e não só, entrou em verdadeira ebulição! Afinal, depois da chegada dos motores a 4 tempos, nunca tínhamos visto uma novidade que altera de forma tão profunda a forma como imaginamos e se trabalha num fim de semana de GP.
A Dorna, a Federação Internacional de Motociclismo liderada por Jorge Viegas, e ainda a IRTA – associação de equipas – que tem como líder Hervé Poncharal, responsável máximo também da equipa Tech3, realizaram uma conferência de imprensa em pleno Red Bull Ring, onde anunciaram que as corridas Sprint de MotoGP serão uma realidade a partir de 2023.
A decisão está tomada. Faltam agora afinar alguns detalhes para que tudo aconteça sem sobressaltos.
Estas três entidades justificaram a decisão com a necessidade de melhorar o espetáculo para os fãs. Uma necessidade quase obrigatória, até porque, tal como a revista MotoJornal já aqui lhe mostrou, a atual temporada de MotoGP está a ser bastante negativa em termos de público nos circuitos em comparação com o que vimos em 2019, antes da pandemia. E isso sem falar nas audiências de TV.
As corridas Sprint serão a salvação de MotoGP e a forma ideal para atrair os fãs aos circuitos? Essa é uma questão que, até às primeiras corridas de 2023, teremos de ficar sem resposta.
Mas em todo este assunto da introdução das corridas de Sprint na categoria rainha, se há algo que ficou claro, é que esta decisão da Dorna, FIM e da IRTA, está, no imediato, a causar mais problemas e tensão do que aqueles que deverá resolver no futuro.
Carmelo Ezpeleta, como líder do promotor do Mundial de Velocidade, entende que esta é a forma de trazer o seu campeonato para o futuro.
Uma aposta arriscada, que o próprio assume, mas que se tornou inevitável depois do sucesso deste tipo de corridas no Mundial Superbike, mas também na F1. Para Ezpeleta, a peça que faltava neste puzzle eram os fãs. E a gigantesca sondagem e estudo de mercado que a Dorna realizou recentemente junto dos fãs, que se mostraram a favor das corridas Sprint, foi então o sinal que faltava.
Jorge Viegas, presidente da FIM, defende a decisão, revelando que tem falado com os pilotos e até ao momento apenas um se mostra contra as corridas Sprint. Para o presidente da FIM, e nas suas palavras, duas corridas por GP significa o dobro da emoção, pois será no arranque que os fãs centram a sua maior atenção. E Hervé Poncharal mostra-se tranquilo, mesmo tendo em conta que mais uma corrida durante o já preenchido fim de semana de GP colocará sob maior pressão quer pilotos, quer também os técnicos das equipas.
Ouvindo as palavras destes responsáveis, existe um grande grau de unanimidade sobre a introdução das corridas Sprint em MotoGP. Uma unanimidade que está agora a ser fortalecida pelas opiniões dos responsáveis das equipas.
Paolo Ciabatti, diretor desportivo da Ducati Corse, diz que “É a altura perfeita para fazer algo novo e introduzir um novo formato de corridas, tornando-o mais atrativo para os espectadores e para aqueles que vêm ao circuito. Talvez seja preciso algum tempo para entender todas as implicações, mas para nós é algo positivo”, referindo-se ainda à possibilidade de vermos diferentes pilotos para além dos habituais a discutir as primeiras posições.
Na Aprilia Racing, quem falou sobre as corridas Sprint foi Paolo Bonera: “Para os fãs será uma oportunidade de ver mais lutas em pista. Será preciso não arriscar demasiado no sábado, ou perdemos oportunidades no domingo. Para os pilotos também será diferente pois precisarão de dar tudo no sábado, mas sempre a pensar no domingo”.
Da parte da Honda, Alberto Puig refere que “Este formato dará mais exposição (patrocinadores) e mais tempo para os fãs verem corridas, que é o mais bonito deste desporto. O desporto é a própria corrida. Para os pilotos será, diria, exigente, mas também muito interessante do ponto de vista do campeonato”.
Por último nesta onda de unanimidade em torno das corridas Sprint em MotoGP, temos Francesco Guidotti, diretor desportivo da Red Bull KTM Factory: “É tempo de se mudar alguma coisa e evoluir o nosso desporto. No final, é por causa da corrida que estamos aqui. Penso que sim, que será bem-vinda. Teremos de alterar a nossa moto para domingo. Não vamos mudar muito, mas o sábado terá um maior efeito”.
Mas a unanimidade parece acabar por aqui.
Passando ao lado da polémica questão levantada por um jornalista durante a conferência de imprensa no Red Bull Ring, sobre uma possível criação de um sindicato de pilotos, algo que motivou uma reação imediata de Carmelo Ezpeleta, a verdade é que entre os pilotos, aqueles que os fãs mais querem ver em ação, a introdução das corridas Sprint não se apresenta como um tema pacífico.
Aquele que mais se mostra a favor das corridas Sprint é Jack Miller. O australiano, que em 2023 estará na Red Bull KTM Factory, é talvez o piloto de MotoGP que maior interação tem com os fãs.
Miller não costuma ter problemas em dar tudo por tudo, e as corridas mais curtas ao sábado serão então a oportunidade para o australiano vencer. E, em tom de brincadeira, Jack Miller diz até que esta corridas podem permitir aos pilotos ganhar mais dinheiro através dos bónus de vitórias ou pódios.
Também Miguel Oliveira (Red Bull KTM Factory) não passou ao lado desta decisão. Para o português o mais importante parecem ser os fãs: “É um bónus adicional para os fãs e com certeza será emocionante. Será um novo desafio para as equipas escolher a configuração certa para a qualificação para as duas corridas e gerir a alocação de pneus. Espero que tudo corra bem e aproveitemos o novo programa de sábado”.
Mas de uma forma geral, a reação dos pilotos de MotoGP é contrária à chegada destas corridas mais curtas, e que conferem metade dos pontos.
Fabio Quartararo (Monster Energy Yamaha), não demorou muito a revelar publicamente a sua insatisfação. Mostrando-se resignado porque terá de competir, o piloto francês, atual campeão, refere que “A mim não me consultaram e acho a ideia de adicionar uma corrida ao fim de semana de GP totalmente estúpida”.
Os irmãos Espargaró, Aleix e Pol, também estão contra. O mais novo Pol entende que duplicar as corridas é duplicar o potencial de existir um acidente no arranque, o momento mais crítico para os pilotos. Já Aleix Espargaró refere que “Não gosto nada, zero. Isto é MotoGP e não é, com todo o respeito, um campeonato com motos de estrada. Aqui temos muito mais trabalho, muita eletrónica e muitos engenheiros”.
Refira-se que Aleix Espargaró, no rescaldo da polémica, tem estado envolvido numa discussão na rede social Twitter com o piloto francês Loris Baz, que atualmente milita no Mundial Superbike, mas que já passou pelo MotoGP.
Alex Rins, piloto da Suzuki Ecstar, é mais um dos que não esconde a sua insatisfação e toca também na questão da segurança: “Eu prefiro como está agora. No final é um arranque com a adrenalina no máximo, e já está. Isto poderá significar mais risco”.
Vencedor dos últimos três Grandes Prémios, Francesco Bagnaia fez ouvir a sua voz sobre as corridas Sprint. O italiano da Ducati Lenovo Team não fala na questão da segurança, nem parece ser totalmente contra as corridas em si, mas não esconde que gostava que os pilotos tivessem sido ouvidos antes da decisão ser tomada: “É uma decisão importante, e não nos disseram nada (antes da conferência na Áustria). Teremos que aguardar por todos os detalhes. Vamos ver o que nos dizem, mas eu penso que a nossa voz deveria ter contado um pouco”.
E nesta situação falta ainda falarmos de uma peça fundamental no funcionamento das equipas de MotoGP: os técnicos e engenheiros.
Ainda que os pilotos sofram mais diretamente as consequências da introdução de uma corrida Sprint, serão os seus técnicos e engenheiros que vão ter de trabalhar de uma forma completamente distinta entre a corrida de sábado, mais curta, e a corrida longa de domingo.
Ramón Forcada, atual chefe técnico do piloto Andrea Dovizioso na WithU RNF Yamaha, e um dos mais experientes do paddock de MotoGP, aproveitou as questões ou dúvidas de alguns fãs na sua página pessoal no Twitter para também dar a sua opinião.
E na opinião de Forcada, ninguém quis saber dos técnicos e engenheiros! Nem mesmo as suas equipas que deveriam estar em comunicação constante com os seus elementos.
Para Ramón Forcada, não só a primeira sessão de treinos livres de MotoGP deveria deixar de contar para a tabela de tempos combinados que permite encontrar os pilotos que passam diretamente à Q2 ou que têm de enfrentar a Q1, como “Os diretores são diretores, não são técnicos. A equipa técnica tem sido completamente ignorada, como sempre”.
Mas para este experiente técnico espanhol, nem tudo é mau. Preferindo ver o lado positivo das corridas Sprint, Forcada afirma que “A corrida Sprint não me parece má de todo, se fosse feita uma planificação correta do Grande Prémio. Cada vez temos menos tempo para afinar a moto e cada vez os detalhes contam mais, tendo em conta que estamos apertados de tempo”.
Veremos se nos próximos meses a Dorna, a FIM e a IRTA conseguem afinar melhor as corridas Sprint.