Faro recebeu em festa o final do 23ª Lés-a-Lés

O Portugal de Lés-a-Lés, a maior maratona mototurística da Europa, saldou-se este ano por um sucesso absoluto para os quase dois mil e quinhentos participantes.

Das longas retas às curvas de enorme prazer

Foi um dia quente, muito quente, com temperaturas acima dos 30.º centígrados durante a maior parte da 3.ª e última etapa do 23.º Portugal de Lés-a-Lés, aquela que levou o pelotão com quase 2500 motociclistas de Abrantes até Faro. Uma jornada, longa de 387 quilómetros, que começou com o a passagem pela charneca antes das longas retas alentejanas, entrecortadas por escapadinhas à descoberta de surpreendentes tesouros de paisagens e monumentos pouco conhecidos. Porque, esta edição, a primeira de cariz temático, garantia “Muito mais Que a N2” mesmo se, qual cereja no topo do bolo, terminou com 56 km de absoluto prazer de condução ao longo das curvas da Estrada Património, autêntico paraíso para milhares de motociclistas que anualmente aqui vêm arredondar os pneus.

Um dia de enorme diversão para os mais experientes, como Hélder Alves que vai na nona participação, sempre aos comandos de uma Jawa 250 fabricada em 1952, «e que voltou a terminar sem qualquer problema», como dos estreantes, mesmo sendo ex-pilotos. Como Luís Filipe Santos que, depois de deixar as pistas de motocrosse em 2012, e os trilhos de enduro em 2014 adorou «uma experiência realmente diferente, com um ambiente muito salutar e onde é visível o prazer em andar de moto, mas também em estar com os amigos, e assim comungar da paixão mototurística de uma forma ímpar».

Com Abrantes pelas costas, a travessia do Tejo foi, para muitos, o despertar para uma etapa de vistas largas, de paisagens com longínquo fio de horizonte e retas a perder de vista. E muitas surpresas, sim, porque há sempre surpresas nos eventos delineados pela Comissão de Mototurismo da Federação de Motociclismo de Portugal, como a passagem pela modernaça ponte pedonal de Ponte de Sor ou a travessia na Ribeira do Andreu que deu para mais do que simplesmente arrefecer motores. Muitos houve que também ficaram com os pés frios depois de molhados nas gélidas águas matinais de um dos afluentes da Ribeira de Sor.

Fortunas e contas de outras letras

Manhã fresca antes de uma tarde que haveria de ser abrasadora, através de um Alentejo que parecia aguardar a passagem da caravana para transformar em amarelo seco, o verde dos cereais, com colheita adiada por força das chuvas tardias. E continuaram as surpresas, seguindo com a fortuna da freguesia de Galveias, uma das mais ricas do País graças à herança deixada há 50 anos pelo comendador José Godinho de Campos Marques, e que tem no escritor José Luís Peixoto, um dos galveenses mais ilustres, e, logo a seguir, a extrema simpatia de Aldeia Velha que viveu o maior engarrafamento da história. Bem menor a confusão na passagem por Ciborro, única localidade na N2 que tem um marco miriamétrico das centenas. E logo do km 500, sendo o único em mármore, principal fonte de sustento da região.

Montemor-o-Novo e o altaneiro castelo, a passagem por um troço da original N2, com direito a cruzamento com uma linha de água que, em invernos normais, torna impraticável a estrada por inundação, foram as notas seguintes de um road-book que até poderia ter uma página inteira dedicada á Gruta do Escoural.

Não fosse dar-se o caso desta ser uma caravana de dimensões recordistas, inviabilizando qualquer possibilidade de visita ao espaço. Menos limitações no jardim central de Alcáçovas, onde a doçaria regional fez as delícias de todos. Tal como aliás o Museu dos Chocalhos, instalado no Paço dos Henriques, onde foi selado o acordo em que Portugal e Castelo dividiram o Mundo na horizontal com linha logo abaixo das Canárias.

Histórias que abriram o apetite para o lanche oferecido no Oásis Honda, na Barragem de Odivelas, construída em 1972 com água represada da ribeira de Odivelas, usada principalmente para a irrigação, tem um paredão com 500 metros de comprimento e 55 metros de altura, com depois desaguar no rio Sado depois de cumprir os 70 km desde a nascente. Imponente também as minas de Aljustrel, terras esventradas desde o tempo dos romanos, com centenas de quilómetros de túneis ramificados ao longo de extensa área. Uma zona que guarda outras memórias de tempos ancestrais, como a sangrenta batalha de 1139, quando D. Afonso Henriques venceu exército muito mais numerosos dos reis mouros de Sevilha Badajoz, Elvas, Évora e Beja. Mural de S. Pedro das Cabeças, recordada no Mural de S. Pedro das Cabeças. Batalha de Ourique que, pelo significado que encerra e pelas características simbólicas a que está associada, é a principal lenda épica da história portuguesa: a gesta de D. Afonso Henriques que, sob a proteção divina, dá corpo ao ato heroico e audaz de pelejar e derrotar o inimigo mourisco, lançado os alicerces que sustentam a identidade nacional. Claro que depois ia curar-se para as Termas de S. Pedro do Sul…

Painel bem diferente, muito mais pacífico, à entrada de Almodôvar, com a representação mototuristas no adeus às planícies deste Lés-a-Lés, entrando na Estrada Património, pouco mais de meia centena de quilómetros (56 km para ser rigoroso tem o troço classificado em 2003), de absoluto prazer de condução até S. Brás de Alportel. Localidade onde a Casa da Memória da N2 guardava o penúltimo carimbo, começando a deixar, desde logo, saudades de mais um Portugal de Lés-a-Lés.

Que, desta feita, terminou em Faro onde 35 carimbos em passaporte exclusivo substituíram os tradicionais controlos com os alicates sendo certo que, em 2022, a capital algarvia será palco de partida para mais uma edição da grande aventura.

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