Pedrinho, um grande 13
Pedrinho.
4 de Dezembro, 4ª feira, vai a manhã a meio e entretenho-me a visitar alguns sites que me garantam um tempo bem passado.
Entro no endereço motogp.com e… Surpresa das surpresas, deparo-me com uma imagem de Miguel Oliveira, bata de assistente de dentista, com a legenda Off the Racing Line #1: Miguel Oliveira.
Um vídeo que convida para uma viagem ao passado, um vídeo, creio eu, a fazer a ponte para uma viagem ao futuro.
Fui a correr.
Escusado será dizer, foi a eito, de uma ponta a outra, duas vezes.
Terão alguns leitores tido já oportunidade de fazer o mesmo, outros, estou certo, para lá caminharão logo que possível.
Por entre uma série de memórias, de visitas a momentos mais privados e pessoais, relembramos o trajecto que já antes descobríramos no livro Next Level.
A certa altura do vídeo surge-nos a imagem de um capacete onde descortinamos o olhar de uma criança, não se trata do nosso Falcão e no entanto parece repetir-lhe a história, o passado, a vontade, nesse mesmo momento poderia jurar que já antes me cruzara com a certeza trazida naquela expressão, é um olhar para um ponto longínquo mas aparentemente ali perto, um olhar com a expressão de se estar a observar algo tão impalpável como o será a garantia interior de se ter descoberto o desejo mor, o desejo de todos os desejos, truz truz, bateu à porta um dom, uma vocação.
Autódromo do Estoril, mês de Julho, ano de 2019, num espacinho por entre corridas saio a comer qualquer coisa numa das roulottes que oferecem hambúrgueres e cachorros, cruzo-me com uma família que traz uma criança pela mão, chama-me a atenção o chapéu com o número 13 e o ar despachado de quem quer ir rápido de volta à bancada por cima do paddock, curioso meto conversa, fico a saber que são as motos, as corridas e aquele mundo de duas rodas a paixão que lhe faz brilhar o olhar e lhe traz o passo apressado.
Chegado a casa, pesquiso um pouco, tarefa hoje em dia facilitada por um mundo de gúgueles e uiquipédias…
Pedrinho Matos, eis de quem trata o assunto.
De Santo André, essa Vila Nova, chega-nos esse 13 que não é de sorte ou de azar, é antes de puro talento trazido num franzino corpo de nove anitos, um pequeno loirinho que imaginaríamos talvez irrequieto mas não tanto, mexido mas não tão veloz assim.
Pedro Moreira Rodrigues Varela de Matos é o nome de fio a pavio.
Pedrinho Matos, o 13º, será como o iremos guardar em nossas notas de gente que adivinhamos graúda em seu mister.
Aguçada a curiosidade e já que pelo mundo da rápida informação me encontro, aqueço um café que vou sorvendo em pequenos goles, à medida que desfio dados acerca deste petiz candidato a graúdo voador.
E o que me trazem as novas acerca deste pequenote campeão?
Em 2018, com sete anos ainda, inicia a participação na Oliveira Cup e o mínimo que podemos dizer é que em boa hora o fez. Em sete provas vence seis , às quais acrescenta um segundo lugar, conquistando o título de Campeão.
Este ano sagrou-se Campeão Nacional do 2020 FMP classe 1, vencendo seis provas, disputando ainda a Oliveira Cup, que termina como vice-campeão vencendo quatro corridas.
Em Espanha participou em duas provas do Campeonato da Andaluzia, a primeira em Badajoz, terminando no pódio com um 3º lugar e a outra em Cartaya onde viria a terminar na sexta posição.
Recordo agora com mais detalhe o momento em que no Verão me cruzei com este cachopo e seus pais, recordo-lhes os sorrisos naquele dia de sol.
Natacha e Pedro Nuno.
Pergunto-me então, são várias as coisas para as quais não encontro resposta, aliás já o fiz em crónica anterior, onde se terá dado o momento em que estes pais esqueceram o conselho prudente do ‘vai devagar meu filho, já te pedi’ e secretamente passaram a desejar cronos cada vez mais baixos?
Onde terão ido buscar a fórmula para saber sorrir e afagar na hora de uma derrota, onde se aprende a saltar despreocupado quando o seu rebento consegue uma velocidade que se utilizasse em casa haveria de conseguir apresentar-se para o jantar ainda o relógio marcaria horas para o lanche?
Onde se guarda bem guardadinha a ansiedade? … o que fazer quando todo um mundo, toda uma bancada torce, grita, empurra, deseja mais e mais… Quando o limite é o limite e mais qualquer coisinha…? Passe a redundância da coisa…
Pedrinho Matos, o menino do treze que iremos guardar, saltando de uns dias curvando deitado de joelho no chão, de corridas ao sol e à chuva para correrias na escola Nº 4 em Santo André, trocando os conselhos de Miguel Oliveira pelos da Professora Cristina, é ele, já terão adivinhado, quem nos surge na imagem de um capacete onde descortinamos o olhar de uma criança no vídeo da Dorna acerca do nosso Falcão.
Haja tempo e sugiro que busquem a imagem.
Olhar de quem vê qualquer coisa mais.
Olhar talvez de quem tenha um dom.
Não se largue o vídeo e passado um pouco vê-lo-emos a sair da moto ajudado pelo próprio Miguel Oliveira, cabisbaixo, num quase choro escutando quem sabe, quem está ali para lhe ensinar, num ápice abandonando a tristeza e tornando-se na esponja que tem a rara possibilidade de escutar um piloto de MotoGP.
Cairá mais e muitas vezes mas a lição, esta ficou aprendida, mais calma nas voltas de aquecimento, o punho rodado a fundo entra um nadica mais tarde.
Cairá de novo mas não trará então o semblante de menino triste, antes o da urgência de regressar à pista e fazer melhor, ou é assim, ou não é de modo nenhum, mil quedas estão adivinhadas na sebenta mental de um campeão, todas elas trazendo centímetros ou levando milésimos de segundo na equação cuja solução está reservada a predestinados.
Quis o destino que me cruzasse com aquele loirinho no Estoril com fome de paddock, o mesmíssimo que me ofereceria o olhar de alguém que sabe o caminho, sentado numa mota a meio de um vídeo da Dorna que correrá mundo.
Um menino mais, de entre tantos que buscam seu sonho.
Olhem, chorem, caiam e levantem-se.
E nós?
Nós estaremos numa bancada ansiosos por vos ver ganhar.
Pedrinho Matos, o XIII, go and get them!