Ele há coisas do arco da velha!

Henrique Saraiva – Autor do blogue Viagens ao Virar da Esquina

Hoje, num daqueles momentos agora habituais, peguei numa revista já lida. Motojornal, pois claro.

Como sempre faço, comecei a folheá-la de trás para a frente. Passei pelos preços das motos, o Tó Manel comentava a apresentação do Lés a Lés de 2020 e falava-nos sobre a utilização dos mapas e GPS nas viagens. Depois…o título dizia “Tá quase!” e falava-nos do MotoGP que estava quase a começar… “pois”… pensei eu!

Continuei: vi as reportagens das primeiras provas de MX (Torres Novas), TT (Góis) e Enduro (Régua).

Depois um choque: lá se perguntava, sobre o mundial SBK: “O melhor de sempre?”. A resposta foi dada logo nos 2 dias seguintes na Austrália: 3 vencedores diferentes em três marcas diversas.E muitas outras coisas interessantes, a Oliveira Cup, novas motos, etc.

Finalmente cheguei ao Editorial do Domingos Janeiro, cujo título era “Começou a acção” e as primeiras palavras diziam: “Acabaram-se os fins-de-semana monótonos. O desporto…está de volta!”

Pois é, já nessa altura vozes se levantavam sobre a possibilidade de suspensão de algumas provas, mas a coisa era lá do outro lado do mundo. Estávamos a 28 de Fevereiro! E era a Motojornal nº 1477.

Quem nos diria que 2 semanas depois teríamos o “estado de alerta” e uma semana após ficaríamos fechados em casa por um “estado de emergência” que nos é servido em prestações suaves de 15 dias…sem fim à vista…e sem acção, com fins de semana ainda mais monótonos!

Tudo por culpa do raio de um bicho que apareceu no Oriente e, tal como aquelas encomendas de quinquilharia que mandamos vir daqueles sites chineses que todos conhecemos, demorou cerca de um mês a cá chegar! E atacou em força. Até ver, mais lá fora que cá, felizmente.

Motociclista que é motociclista é um optimista nato. Estamos habituados a enfrentar dificuldades no nosso dia a dia. E quando nos perguntam se queremos ir pela estrada fácil ou pela difícil…a resposta é óbvia: difícil! E quanto mais, melhor.

Então vamos fazer render este tempo enclausurados para nosso benefício.

A esta hora, já todos lavámos, lubrificámos, verificámos as nossas motos. E, se calhar, já vamos na segunda volta, não vá algo ter ficado esquecido… Muitos já mandámos vir (pelo correio, pois claro) aquele gadjet obviamente necessário. As motos estão preparadíssimas! E a bagagem reúne-se em menos tempo do que demora a dizer…

Mesmo que ainda não vejamos o fundo ao tacho, de certeza que este estado de coisas não se vai eternizar. Daqui a dias ou semanas, alguma liberdade de circulação nos será concedida. É inevitável. Mas também certamente acompanhada das recomendações para não haver “esticanços” perigosos …

Para aqueles que tinham planos de longas tiradas, olhemos para o mapa….Espanha, França, Itália? Pirinéus, Alpes ou Dolomitas… já perceberam onde quero chegar.

Temos solução? Claro que sim! É óbvia e está aí à mão. Vamos todos percorrer Portugal!

“Já conheço!” dirão alguns. Ok….duvido que conheçam tudo. E há tanto para descobrir. Vejam a lista das estradas nacionais (essas do Plano Rodoviário de 1945 com a EN2 à cabeça). Procurem nomes de localidades ao acaso…e vão ao Google ou à Wikipédia. De certeza que muita coisa lá encontrarão…que ainda desconhecem!

E se ainda assim não estiverem convencidos, então lanço um desafio, à laia daqueles jogos de tabuleiro que se jogavam antes de nos enfronharmos nos écrans dos telemóveis:

Para começar, temos que lhe dar um nome. Gosto de brincar com siglas. Porque não “COVID – Como Organizar uma Viagem Interessante e Divertida”?

Se acharem que é de mau gosto, chamem-lhe outra coisa qualquer…Anacleto, por exemplo.

Primeiro que tudo, necessitamos de um Mapa das Estradas de Portugal e de um desenho da Rosa dos Ventos.

Com um pedaço de cartolina desenham-se 8 rectângulos em formato de carta de jogar. Em cada um deles vamos escrever (ou desenhar, para os mais habilidosos) um dos 4 pontos cardeais – Norte, Sul, Este e Oeste – e um dos 4 pontos colaterias – Nordeste, Sudeste, Noroeste e Sudoeste.

De seguida recortamos mais 7 rectângulos idênticos mas onde vamos escrever uns números que representam quilómetros: 50, 75, 100, 125, 150, 175, 200.

Também pode ser útil termos uma régua graduada e em função da escala do mapa, percebermos como calcular as distâncias.

E agora vamos jogar: abrimos o mapa, colocamos a Rosa dos Ventos por perto, baralhamos cada um dos 2 conjuntos de cartas que voltaremos com as inscrições para baixo.

O jogo começa onde quisermos, por exemplo, na nossa terra. Retiramos uma carta do grupo dos pontos cardeais e ela vai determinar a orientação que pretendemos. Depois retiramos uma carta das distâncias. E temos a orientação e a distância da nossa primeira etapa. Convém perceber se, atendendo à dimensão do País, não vamos parar a meio do oceano!

Definido o primeiro destino, agora podemos dedicar-nos a pesquisar tudo sobre essa zona, o que há para ver, alojamento, gastronomia, tradições, etc. (ou podemos deixar esta fase para depois de termos todo o nosso trajecto definido). E unir o ponto de partida e o de chegada pela estrada mais arrevezada que nos aparecer à frente. Que também poderá ter pormenores interessantes para conhecer. Se é para ser difícil, seja!

Um exemplo: NE e 200 km, com saída de Lisboa. Vamos ao mapa e dá-nos a Sertã…ou algo lá perto (podemos ser flexíveis). O caminho? EN118 até Abrantes e depois a EN2 até ao objectivo. Castelo de Almourol, curvas do Tramagal, Penedo Furado, Centro Geodésico de Portugal….

A segunda etapa repete o processo mas com um cuidado: retiramos a carta com o ponto cardeal/colateral oposto do que saiu antes (se saiu Norte, retiramos o Sul) para não voltarmos pelo mesmo caminho! Se a nossa viagem tiver 7 ou menos dias também podemos retirar, mas de vez, a carta de quilómetros que nos saiu na jogada anterior para que as etapas tenham diferentes durações.

E assim sucessivamente! Vamos jogar? E porque não partilhar os resultados nas redes sociais? Ainda nos vamos encontrar todos ao virar da esquina.

Porque o objectivo final é esse: vamos encher as estradas de Portugal!

O nosso País merece…e precisa. Vamos dar vida à vida das nossas terras e terrinhas, alimentar as economias locais que bem precisam. Conhecer os nossos concidadãos e a sua realidade. Vamos ser portugueses em Portugal!

#VamosEncherPortugaldeMotos