Portugal Lés-a-Lés: chegada triunfal a Felgueiras

Foi, para muitos experientes motociclistas, uma das mais espetaculares etapas do Portugal de Lés-a-Lés ao longo dos seus 20 anos de existência. Jornada memorável onde tudo se conjugou em prol de uma perfeição mototurística que deixa fortes memórias para toda a vida.

Em dia excelente para a prática da modalidade, ligação fabulosa entre Lamego e Felgueiras encerrou, assim, com chave de ouro a edição comemorativa do 20º aniversário da grande aventura organizada pela Federação de Motociclismo de Portugal, com etapa, a 3.ª, que foi verdadeiro regalo para os sentidos. Das deslumbrantes visões do Douro vinhateiro ao paladar das deliciosas cerejas de Resende, do olfato serrano do Marão ao excelente ‘tato’ do asfalto no Alvão, ou na audição do silêncio à passagem pelas serranias do Barroso. Bom, na verdade o silêncio foi apenas antes da passagem da caravana de todos os superlativos. Porque aí a animação tomava conta do ambiente, despertando aldeias de prolongada letargia, animando de forma sincera e sentida quem poucos motivos descobre para sorrir num dia-a-dia de agruras e direza.

Temperatura acertada para andar de moto, exatamente no ponto em que o frio deixa de incomodar para dar lugar ao calor, mas sem que o aconchego do indispensável equipamento crie desagradável sensação abafada e, sobretudo, sem chuva. Apesar das nuvens sempre presentes ao longo de todo o montanhoso percurso, de estradas fabulosas e paisagens soberbas. Daquelas que espairecem a alma e enchem o coração, ao longo de 353 quilómetros de puro prazer mototurístico. Na passagem pelas margens do Douro, onde a vinha cede terreno à mais deliciosa cereja do Mundo – comprovado por toda a longa e heterogénea caravana com direito a prova em Resende! – como na subida à Serra do Marão, através da ‘arredondada’ e algo esquecida N15, apreciando ao longe os sinais de modernidade rodoviária, do IP4 e da mais recente A4 e do seu enorme túnel, inaugurado há dois anos. Emoções fortes que foram motivo de conversa na primeira paragem do dia, no Alto do Velão, mesmo antes da entrada na Serra do Alvão, onde o concessionário da BMW nos Carvalhos criou Oásis que juntou vistas deslumbrantes ao agradecido café e a deliciosas natas no Oásis Antero.

 

 

Em direção a Mondim de Basto, tempo para apreciar mais paisagens fabulosas, num dia a todos os títulos excelente, com zona menos afetada pelos incêndios e com floresta autóctone mostrando o quão mais bonitas podiam ser as paisagens portuguesas. Tempo de descanso para os motores das pequenas 50 cc, aproveitando a descida para arrefecer um pouco depois de tanto sofrimento nas exigentes subidas. Ocasião também para Cândido Barbosa – o mais vitorioso ciclista português de sempre e que há 7 anos não perde uma edição do Portugal de Lés-a-Lés… – recordar o enorme susto aqui sofrido em 2003, com despiste a grande velocidade na descida da etapa da Volta a Portugal que terminou no Alto da Sr.ª da Graça. Mas era dia de jornada bem diferente, sem outras preocupações que não desfrutar ao máximo da paisagem e das estradas, onde o triunfo pertenceu, como sempre, a quem mais se divertiu. Mas que, tal como no ciclismo, teve direito a massagens para minimizar sinais de cansaço que os muitos quilómetros acumulados desde o Algarve iam revelando. Na imponente e senhorial Casa da Tojeira, construída no séc. XVII bem perto do Arco de Baúlhe, tempo para provar o vinho verde produzido na propriedade de 20 hectares, acompanhando as bifanas servidas pelos indómitos Bombeiros Voluntários de Cabeceiras de Basto, e usufruir das massagens do IMT. Não do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, antigo IMTT, mas sim do Instituto de Medicina Tradicional que tanto ajudou a minimizar as mais aborrecidas dores de costas e até algum formigueiro causado por tantas horas de condução.

Apoio muito agradecido na hora de apreciar as paisagens de etapa fabulosa, das mais bonitas de sempre do Lés-a-Lés, cumprindo promessas da Comissão de Mototurismo da FMP, em dia pleno de locais pitorescos e muito fotogénicos. Como Pedraça ou Cavez, Vilela ou Meijoadela, Uz ou Moscoso, pequenas aldeias a caminho da Serra do Barroso, que marcaram entrada discreta no concelho de Montalegre: E que teve ainda direito a visita a Vilarinho Seco, uma das mais altas aldeias de Portugal, na rápida incursão ao concelho de Boticas. Deslumbramento ao virar de cada curva, como na aproximação a Montalegre, passando bem junto da barragem do Alto Rabagão em momento de enorme descontração antes do ‘susto enorme’ oferecido pelas bruxas, dráculas e outros seres bizarros do Moto Clube Os Conquistadores. Divertidos motociclistas de Guimarães (e não só…) que proporcionaram o mais irreverente e bem-disposto dos 18 controlos, juntamente com os eletricistas-sabotadores dos Moto Galos de Barcelos, que haveriam de ser descobertos mais à frente, mas também do MC Albufeira e Motards do Ocidente com os geniais ‘quadros’ pintados na véspera em momentos de animação acrescida, que dão outra vida ao Lés-a-Lés.

 

Claro que o ‘leit-motiv’ da maior aventura mototurística da Europa é, claro está, a descoberta de paisagens e do património, o conhecimento de um Portugal pouco explorado, e esse princípio ficou bem patente na abordagem ao único Parque Nacional do País, o da Peneda-Gerês. Onde continuaram as curvas, milhares delas, capazes de agradar a ‘gregos e troianos’. Mas, sobretudo, aos 180 motociclistas das mais diversas regiões de Espanha, como aos oriundos da Rússia, Croácia, Hungria, França, Itália, Irlanda, Alemanha, Inglaterra, Holanda, Suíça, Chile, Brasil, Estados Unidos e Canadá, no mais internacional pelotão de sempre. Que, no dia de todas as montanhas, haveria ainda de passar pela serra da Cabreira, na transição de Trás-os-Montes para o Minho, e onde, além de mais curvas, existem mais barragens. Como a Guilhofrei, uma das mais antigas do País, construída em 1938 para impulsionar o crescimento da indústria têxtil do Vale do Ave. Momento que, por si só, ajudou a perceber e justificou a mudança do património paisagístico e histórico que havia marcado todo o evento até este momento, dando lugar ao património industrial. Mas sem que isso implicasse qualquer desvirtuar da filosofia do Lés-a-Lés, sempre através das mais cativantes estradas e com motivos de interesse acrescido em cada paragem, em cada um dos 18 controlos horários secretos.

O último, às portas do Mosteiro de Pombeiro, inspirou os monges… perdão, os sócios do Moto Clube do Porto, único clube totalista com controlos em todos as 20 edições do Lés-a-Lés, a presentearem os 2100 participantes com a última marca na tarjeta que atesta o cumprimento do percurso integral. E, com ajuda da ‘Madre Superiora’ e do próprio ‘Bispo’, encorajaram todos para os derradeiros quilómetros da aventura até Felgueiras. Mal sabiam estes o que os esperava na Capital do Calçado, com receção apoteótica, juntado milhares e milhares de espectadores no centro da cidade, ovacionando todos os participantes, dos mais conhecidos Carmona Rodrigues, ex-presidente da CM de Lisboa, João Oliveira e Miguel Tiago, deputados do PCP, os atores Helena Costa, Vítor Norte e Alexandre da Silva, o ex-ciclista Cândido Barbosa, os autarcas Rogério Bacalhau (Faro) ou Ângelo Moura (Lamego), aos milhares de ‘anónimos’ motociclistas que tornaram este 20.º Portugal de Lés-a-Lés em gigantesca festa, ao longo dos 1160 quilómetros entre Faro e Felgueiras, com paragens em Portalegre e Lamego.